Quarta-feira da 28ª Semana.
Diante da síntese compilada pela tradição das primeiras comunidades, certamente este trecho causou perplexidade, esperança e alento na luta ao longo do Caminho. Estamos em Lucas 11,42-46. O lugar da mensagem é o local da denúncia. Não há uma dissociação da realidade. O Carpinteiro, neste cenário fala às multidões e ao círculo de seguidores mais próximos. Não há meias palavras, o Mestre "põe o dedo" na ferida exposta e conscientiza o povo em relação a hegemonia da elite dominante, a qual busca manter o povo escravizado com os seus pesados fardos "legislativos" e interpretações esdrúxulas que apenas beneficiam a uma horda de privilegiados, em detrimento da coletividade e da igualdade de direitos. Não é à toa que o discurso de Jesus é bastante enfático e não deixa dúvidas quanto à situação posta, constitui um anúncio-denúncia com potencial bastante explosivo, por ser carregado de verdade, reconhecendo a autoridade estabelecida e condenando as suas práticas eivadas de descaminhos:
Naquele tempo, disse o Senhor: 42 "Ai de vós, fariseus, porque pagais o dízimo da hortelã, da arruda e de todas as outras ervas, mas deixais de lado a justiça e o amor de Deus. Vós deveríeis praticar isso, sem deixar de lado aquilo. 43 Ai de vós, fariseus, porque gostais do lugar de honra nas sinagogas, e de serdes cumprimentados nas praças públicas. 44 Ai de vós, porque sois como túmulos que não se vêem, sobre os quais os homens andam sem saber". 45 Um mestre da Lei tomou a palavra e disse: "Mestre, falando assim, insultas-nos também a nós!" 46 Jesus respondeu: "Ai de vós também, mestres da Lei, porque colocais sobre os homens cargas insuportáveis, e vós mesmos não tocais nessas cargas, nem com um só dedo".
Alguma semelhança com a atuação de alguns grupos em nossos dias, verdadeiras "organizações criminosas"? Pensemos! Olhemos ao nosso derredor! Quantos estão denunciados à Justiça! Embalados pelo egoísmo e ambição, levam milhões ao desespero, a fome e a miséria. Sequestrando os direitos fundamentais do povo a educação, a saúde e a moradia. O povo passa fome!!! É o que voltamos a ver no nosso cotidiano com o corte nos programas sociais e o aumento de moradores de rua. Até quando Senhor os poderosos escarnecerão de Vós, através do vosso povo? Verdadeiras fortunas, em impostos que somam vultosas dívidas, são perdoadas aos ricos e poderosos, enquanto até o salário mínimo, que é ínfimo e não garante as necessidades básicas de sobrevivência, é reduzido. Por qual razão é mais "fácil" tirar dos pobres e despossuídos? Dívidas milionárias não são cobradas aos poderosos e a previdência social é reduzida cada vez mais em todos os seus benefícios. Economizam às custas dos empobrecidos. A aposentadoria se torna um sonho inatingível para os pobres, para os quais há a necessidade de trabalhar pesado desde a mais tenra idade e não conseguem atingir o limite mínimo de idade para a concessão do benefício; morrem antes ou lá chegam com muita dificuldade e desde há muito sem forças para o desempenho das suas atividades, que são bastantes pesadas. Aqueles que sucateiam a educação pública, mantêm seus filhos nas escolas privadas e caras destinadas à elite. Aqueles que administram o sistema de saúde, não o utilizam, buscando os seguros e planos de saúde, além de tratamento de médicos e hospitais particulares. Aqueles que fixam o quantum do salário mínimo, não vivem com estes valores, ao contrário, recebem, trinta ou quarenta vezes mais, criando um imenso fosso entre eles e os pobres. Aqueles que se refestelam nos banquetes, não conhecem os parcos alimentos que chegam à mesa dos pobres e nunca sentiram o espectro da fome e da subnutrição. Aqueles que moram em mansões, verdadeiros palácios, sequer imaginam as agruras pelas quais passam os moradores de rua, de favelas ou de palafitas. O lidar com estas injustiças é o cerne do discurso de Jesus. O Reino representa a luta pela Justiça e Igualdade para tod@s; a Esperança que alimenta os embates pela mudança da realidade; a utopia de que um mundo novo é possível a partir do aqui e do agora. Jesus não fecha os olhos com a situação de injusta e hipocrisia na qual a sociedade está mergulhada. Ele a confronta, não a partir de uma pregação pseudo-moralista, porém da denúncia das injustiças e do anúncio da possibilidade de mudança dessa realidade em conformidade com os valores do Reino: Paz como fruto da Justiça e, a partir daí, a Igualdade de filhos do Pai Criador. O discurso é bastante claro e não deixa dúvidas ou espaço para tergiversações. E quanto a nós? Como nos colocamos diante da nossa realidade? Como nos posicionamos? Como nos portamos? Qual a nossa prática? Pensemos nisso. Que a paz esteja com tod@s!
Imagem colhida na internet. Crédito não conhecido.